Só a ruptura com os bloqueios<br>e constrangimentos abre caminho<br>ao desenvolvimento

Não ha­verá cres­ci­mento sus­ten­tado nem de­sen­vol­vi­mento en­quanto per­ma­ne­cerem os cons­tran­gi­mentos que es­tran­gulam e amarram o País.

Cres­ci­mento sus­ten­tado exige romper com o ca­pital mo­no­po­lista

Esta foi uma ideia-chave rei­te­rada dia 8 pelo Se­cre­tário-geral do PCP no de­bate quin­zenal no Par­la­mento, onde voltou a su­bli­nhar que a não serem re­mo­vidos os obs­tá­culos com que se con­fronta a eco­nomia na­ci­onal e re­la­ti­va­mente aos quais há di­ver­gên­cias face ao PS – o peso da dí­vida e do ser­viço da dí­vida, a sub­missão ao euro e o do­mínio do ca­pital mo­no­po­lista sobre os sec­tores es­tra­té­gicos –, per­sis­tirá o im­passe que nos tolhe os mo­vi­mentos, que im­pede o pleno apro­vei­ta­mento dos nossos re­cursos e a cons­trução de um fu­turo me­lhor.

Num de­bate do­mi­nado pela questão do cres­ci­mento eco­nó­mico, tema que de resto deu o mote à in­ter­venção ini­cial do chefe do Go­verno, Je­ró­nimo de Sousa in­sistiu na im­pe­riosa ne­ces­si­dade de o País crescer, o que do seu ponto de vista não é al­can­çável de «forma sus­ten­tada com op­ções po­lí­ticas que fazem da re­dução do dé­fice a questão pri­meira da acção go­ver­na­tiva».

Tal como não se faz, pros­se­guiu, «à custa da re­dução do in­ves­ti­mento pú­blico, in­ves­ti­mento ne­ces­sário quer para os sec­tores pro­du­tivos, quer para as­se­gurar as infra-es­tru­turas ne­ces­sá­rias ao de­sen­vol­vi­mento do País».

Para o líder co­mu­nista, o cres­ci­mento eco­nó­mico sus­ten­tado não se ga­rante ainda com a «des­va­lo­ri­zação da força de tra­balho como va­riável única de ajus­ta­mento ma­cro­e­co­nó­mico», de­fen­dendo, bem pelo con­trário, que só se atinge com a «ele­vação das con­di­ções de vida do povo como ala­vanca desse cres­ci­mento».

A «prova pro­vada» disso mesmo e da im­por­tância do tra­balho e dos tra­ba­lha­dores está, aliás, nos «avanços ve­ri­fi­cados nesta nova fase da vida na­ci­onal», se­gundo o Se­cre­tário-geral do PCP, que foi igual­mente pe­remp­tório na afir­mação de que não se ga­rante o cres­ci­mento «per­sis­tindo nas pri­va­ti­za­ções, na li­be­ra­li­zação de mer­cados pú­blicos, na des­re­gu­la­men­tação de mer­cados onde do­minam as pe­quenas e mé­dias em­presas, man­tendo o papel do­mi­nante do sector fi­nan­ceiro tal como está».

Eixos que as­fi­xiam

An­tónio Costa, na res­posta, ad­mitiu ser con­sen­sual na so­ci­e­dade por­tu­guesa a ideia de que há um «pro­blema de re­la­ci­o­na­mento entre a moeda única e a con­ver­gência», di­zendo estar em crer que a «me­lhor forma» de de­fender aquela é «criar con­di­ções para que seja pos­sível a con­ver­gência eco­nó­mica». O que, no seu en­tender, «im­plica uma re­forma da zona euro que pre­vina riscos, res­ponda a cho­ques as­si­mé­tricos e, so­bre­tudo, dote a zona euro de uma ca­pa­ci­dade or­ça­mental pró­pria que per­mita fi­nan­ciar o pro­grama da con­ver­gência».

De­pois de negar que o Go­verno tenha o «dé­fice como a pri­meira das pri­o­ri­dades» ou como o «alfa e o ómega» da sua po­lí­tica, o pri­meiro-mi­nistro con­si­derou que uma boa gestão das contas pú­blicas é con­tudo «es­sen­cial».

E a este pro­pó­sito re­feriu o caso das câ­maras mu­ni­ci­pais onde a CDU está em mai­oria, re­la­ti­va­mente às quais disse haver o re­co­nhe­ci­mento de que são «bons exem­plos de gestão pú­blica», como é o caso de Al­mada que elo­giou por ter du­rante muitos anos as «me­lhores con­di­ções fi­nan­ceiras dos 308 mu­ni­cí­pios».

Re­petiu por isso que o ob­jec­tivo do Go­verno não é o de cum­prir o «dé­fice pelo dé­fice» mas «provar que não era pelo facto de repor sa­lá­rios e pen­sões, re­duzir a carga fiscal, repor apoios so­ciais e os ins­tru­mentos de com­bate à po­breza que seria posta em causa a tra­jec­tória de con­so­li­dação das fi­nanças pú­blica».

An­tónio Costa as­se­verou ainda que o Go­verno «está a pros­se­guir a po­lí­tica de re­cu­pe­ração de ren­di­mentos para me­lhorar as con­di­ções de vida», a par do re­forço do in­ves­ti­mento pú­blico (que au­men­tará este ano 20%), ar­gu­men­tando ser esta a tra­jec­tória que «é pre­ciso pros­se­guir» e pela qual Por­tugal deve bater-se no «con­texto eu­ropeu» para ter uma «maior con­ver­gência eco­nó­mica».

Antes, ava­li­ando a re­a­li­dade de outro ân­gulo e sem ilu­sões, Je­ró­nimo de Sousa in­sis­tira na ad­ver­tência de que o País não ca­mi­nhará para o cres­ci­mento sus­ten­tado «se não fizer a rup­tura com os re­fe­ridos eixos es­tra­té­gicos que nos con­di­ci­onam e as­fi­xiam, a dí­vida, o euro, o do­mínio dos mo­no­pó­lios. «O que sig­ni­fica fazer a rup­tura com o poder do ca­pital mo­no­po­lista», afirmou em sín­tese o líder co­mu­nista, que tra­duziu por miúdos o con­teúdo con­creto da sua pers­pec­tiva de de­sen­vol­vi­mento, de que o cres­ci­mento sus­ten­tado é uma das com­po­nentes. Sig­ni­fica, es­pe­ci­ficou, a «pro­moção da pro­dução na­ci­onal e dos sec­tores pro­du­tivos, o apoio ao sector co­o­pe­ra­tivo e às MPME com me­didas de apoio fi­nan­ceiro ao in­ves­ti­mento e de apoio ao cré­dito, re­dução dos preços dos fac­tores de pro­dução, no­me­a­da­mente da energia e dos com­bus­tí­veis».

Mas sig­ni­fica também, en­fa­tizou, a «va­lo­ri­zação dos sa­lá­rios e o com­bate à pre­ca­ri­e­dade, a re­po­sição de di­reitos la­bo­rais pela al­te­ração das leis do tra­balho», bem como a «de­fesa e de­sen­vol­vi­mento qua­li­ta­tivo dos sis­temas pú­blicos da saúde, en­sino e se­gu­rança so­cial».

Caso dos 10 mil mi­lhões
com muito por apurar

Ao caso dos 10 mil mi­lhões de euros que vo­aram do País para offshores voltou também Je­ró­nimo de Sousa para su­bli­nhar a ne­ces­si­dade de «apurar por com­pleto a ex­tensão do pro­blema». O que está desde já porém claro, na sua pers­pec­tiva, é a «con­fir­mação da po­lí­tica de dois pesos e duas me­didas do an­te­rior go­verno PSD/​CDS-PP, que es­magou os tra­ba­lha­dores e o povo com im­postos e obri­ga­ções en­quanto dei­xava sair do País aqueles 10 mil mi­lhões, sem con­trolo tri­bu­tário, sem tratar de saber se havia fraude, crime ou im­postos a pagar».

Afirmou-se ainda ci­ente de que os por­tu­gueses «não per­cebem dos me­ca­nismos e es­quemas que per­mitem esta si­tu­ação, mas sentem que isto é uma pouca-ver­gonha, que nesta ma­téria o crime com­pensa».

E é tendo em conta este «sen­ti­mento de in­dig­nação, justo, da mai­oria dos por­tu­gueses», que con­si­derou ser «tempo de con­ti­nuar a ave­ri­guar» sem nunca fugir ao que clas­si­ficou de «questão de fundo»: bem se pode in­ventar me­ca­nismos de con­trolo, que en­quanto exis­tirem os offshores países como Por­tugal «es­tarão sempre a ser san­grados em vida com esta fuga de ca­pi­tais».

Cor­ro­bo­rando da po­sição de que é pre­ciso «es­cla­recer tudo» sobre o caso, o pri­meiro-mi­nistro lem­brou que o mesmo foi es­po­le­tado a partir do mo­mento em que o ac­tual Go­verno «mandou a ad­mi­nis­tração fiscal pu­blicar os dados que o an­te­rior go­verno tinha man­dado não pu­blicar».

Para An­tónio Costa é es­sen­cial que as pes­soas «sintam que há um sen­ti­mento de jus­tiça na forma como são par­ti­lhados os en­cargos, em par­ti­cular os en­cargos em ma­téria fiscal», la­men­tando que não tenha sido essa a re­a­li­dade num pas­sado re­cente «em que se era muito forte com os fracos mas muito fraco com os fortes».

Do que se trata agora, para o chefe do Go­verno, é «não só de com­bater os offshores mas de ter uma me­lhor har­mo­ni­zação fiscal no quadro da União Eu­ro­peia».

Porque, ex­plicou, aquilo a que se tem as­sis­tido é a «com­pe­tição muito de­si­gual entre vá­rios es­tados», com al­guns a «po­derem criar con­di­ções de atrac­ti­vi­dade fiscal à custa da­quilo que é o ren­di­mento efec­ti­va­mente ge­rado nou­tros es­tados-mem­bros».

Igual­dade no tra­balho e na vida

Je­ró­nimo de Sousa não deixou es­capar a cir­cuns­tância de o de­bate se re­a­lizar no dia 8 de Março, Dia In­ter­na­ci­onal da Mu­lher, e apro­veitou para saudar as mu­lheres por­tu­guesas e re­a­firmar a pre­o­cu­pação do PCP quanto à si­tu­ação e aos pro­blemas com que estas são con­fron­tadas, de­sig­na­da­mente no que toca aos baixos sa­lá­rios, à pre­ca­ri­e­dade, à des­re­gu­lação dos ho­rá­rios, às dis­cri­mi­na­ções e à vi­o­lência de que são ví­timas no tra­balho ou na so­ci­e­dade, no­me­a­da­mente na ma­ter­ni­dade.

E não obs­tante os avanços al­can­çados com a Re­vo­lução de Abril, deu como certo que a «igual­dade está longe de ser uma re­a­li­dade na vida da es­ma­ga­dora mai­oria das mu­lheres por­tu­guesas» e que há um «grande es­forço a fazer para com­bater e pre­venir as di­versas dis­cri­mi­na­ções de que as mu­lheres são ví­timas no tra­balho e na fa­mília».

Lem­brou, a pro­pó­sito da questão la­boral, essa ex­pe­ri­ência pes­soal sua que foi a ne­go­ci­ação há 43 anos do con­trato co­lec­tivo dos me­ta­lúr­gicos. Nele, re­cordou, havia uma norma que im­punha que a mu­lher, in­de­pen­den­te­mente de tra­ba­lhar o mesmo ou me­lhor do que os ho­mens, re­ce­beria sempre menos 10 por cento no seu sa­lário. A norma foi re­vo­gada, mas como ob­servou o líder co­mu­nista nos mais va­ri­ados sec­tores de ac­ti­vi­dade con­ti­nu­amos a de­parar-nos hoje com si­tu­a­ções em que as mu­lheres con­ti­nuam a ser pre­ju­di­cadas ao nível dos seus sa­lá­rios.

Sendo aquele como era um «dia de co­me­mo­ração», Je­ró­nimo de Sousa fez votos para que este «seja também «tempo de con­cre­ti­zação da igual­dade».

An­tónio Costa, que se as­so­ciou à ho­me­nagem às mu­lheres por­tu­guesas, re­co­nheceu a per­sis­tência da si­tu­ação de «de­si­gual­dade de gé­nero entre homem e mu­lher, em par­ti­cular no mer­cado de tra­balho». Erigiu por isso à ca­te­goria de «questão cen­tral» a «pa­ri­dade no poder de de­cisão e da igual­dade sa­la­rial», a par das «me­didas ne­ces­sá­rias à con­ci­li­ação (quer para ho­mens e mu­lheres) entre a vida fa­mi­liar e a vida pro­fis­si­onal».




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